• Tributário
14/dez/2020
Cordeiro
Aspectos Fiscais das Alterações na Lei de Falência e Recuperação Judicial

No final de novembro o Projeto de Lei 4.458/2020 foi aprovado pelo Senado Federal e agora está aguardando sanção presidencial a qualquer momento. O texto traz alterações importantes à Lei de Falência e Recuperação Judicial (Lei nº 11.101/2005). Nesse sentido, os aspectos fiscais da possível alteração são relevantes e alguns deles são preocupantes.

A nova lei, se mantida a redação aprovada até o momento, possibilitará maior flexibilização nas regras para que as empresas em recuperação judicial possam aderir aos parcelamentos tributários (nos termos da transação regulamentada pela Lei nº 13.988/2020, conversão da “MP do Contribuinte Legal” em lei). 

No novo formato, as empresas poderão celebrar parcelamentos com um maior número de prestações – de 84 passa a ser 120 prestações possíveis. Como se sabe, o contexto de turbulência econômica, acrescido da alta carga tributária do país são pontos que colocam negócios em crise, ao passo que a flexibilização para regularização de débitos tributários às empresas em recuperação é uma medida em sintonia com o propósito recuperacional.

O PL também permite que os devedores que já possuam acordos de transação formalizados anteriormente solicitem a repactuação do acordo, desde que atendidos os demais requisitos e condições da Lei Federal nº 13.988/2020 e na respectiva regulamentação.

Quanto aos débitos federais dos devedores em recuperação judicial, haverá também a possibilidade de pagamento de 30% da dívida consolidada no parcelamento à vista, com utilização de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL ou com outros créditos próprios. O saldo remanescente nessa opção poderá ser parcelado em até 84 prestações.

Para aderir a esta modalidade de parcelamento, o interessado deverá atender algumas condições, dentre as quais destacamos: (i) concordar com o dever de amortizar o saldo devedor do parcelamento com até 30% do produto da venda de bens e diretos integrantes do ativo realizada durante o período de vigência do plano de recuperação judicial; (ii) concordar com o dever de manter a regularidade fiscal; e (iii) cumprir regularmente as obrigações com o FGTS.

Outro destaque é a possibilidade de parcelamento de tributos retidos na fonte e do IOF, que atualmente tem hipóteses restritas de negociação. A autorização valerá para débitos constituídos ou não, independente da inscrição em dívida ativa, em até 24 parcelas mensais. As microempresas e as empresas de pequeno porte terão a mesma autorização, com a concessão de prazos 20% superiores àqueles concedidos às demais empresas.

Além das novas oportunidades de regularização fiscal, há impactos nos processos de execução fiscal em trâmite, constrições pleiteadas pelo Fisco e a nova legitimidade para o requerimento de falência pela Fazenda Nacional. Nesses pontos começam as maiores preocupações na perspectiva fiscal.

A eventuais execuções fiscais das empresas em recuperação judicial permanecerão em trâmite regular, não havendo vedação legal à implementação de medidas constritivas, ponto que é sempre objeto de discussão atualmente. Os contribuintes defendem a suspensão das constrições ao menos, por outro lado o Fisco defende a continuidade das medidas. De modo geral, atualmente as constrições e os atos expropriatórios são suspensos enquanto a recuperação judicial permanece em trâmite.

A alteração que o PL traz é apenas a autorização para substituição dos atos constritivos que recaiam sobre os bens essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial. É uma medida paliativa, mas também pode abrir brechas para outras constrições no curso das execuções fiscais.

O projeto também prevê a proibição expressa à distribuição de lucros ou dividendos aos sócios e acionistas até a aprovação do plano de recuperação judicial. A proibição será incluída como crime de fraude contra credores, sujeito às penalidades legais.

Talvez o ponto mais preocupante do PL na perspectiva fiscal é a inclusão da Fazenda Nacional como autoridade legítima para requerer falência. Esse é um ponto controvertido atualmente. Se mantida essa previsão do PL 4.458/2020, a Fazenda Nacional poderá requerer a falência de devedores que descumpram parcelamentos firmados em virtude do pedido de recuperação judicial.  

Atualmente está em discussão a necessidade de apresentação de certidão de regularidade fiscal ao pedir a recuperação judicial (vide Reclamação nº 43.169 – inicialmente o Ministro Fux julgou pela necessidade de apresentação da certidão, contudo o Ministro Dias Toffoli suspendeu a exigência). Ainda que prevista em lei (artigo 57), esse dispositivo é mitigado pela atual jurisprudência, com razão, afinal, se uma determinada empresa está em crise, é razoável crer que existam débitos fiscais em aberto e em diversas situações o parcelamento mostra-se simplesmente impraticável do ponto de vista financeiro.

Nesse aspecto, a inclusão da Fazenda Nacional como autoridade legítima para pedir a conversão da recuperação judicial em falência, em virtude do descumprimento do parcelamento eventualmente firmado no decorrer da recuperação judicial, é algo que acende o sinal de alerta e que possivelmente não será positivo ao contexto da busca pela superação da crise econômico-financeira do devedor, pois, se por um lado facilitar as negociações fiscais é positivo, por outro, o eventual rompimento possibilitará uma consequência severa, que é justamente a conversão da recuperação judicial em falência.

Por fim, as empresas em recuperação judicial ou com falência decretada serão dispensadas do recolhimento do IRPJ e da CSLL em casos de ganho de capital derivado da venda de bens ou direitos, exceto se a operação ocorrer com empresa do mesmo grupo econômico (empresa que seja controladora, controlada, coligada, etc). 

Como dito inicialmente, o PL 4.458/2020 passará pela sanção presidencial (o prazo de análise do Presidente expira no dia 24 de dezembro). Após, na hipótese de eventuais vetos o Congresso Nacional ainda deverá apreciá-los. Contudo, o texto legal está redigido e nos aspectos fiscais das alterações ainda há muito o que esclarecer em efeitos práticos.

A equipe Tributária do Cordeiro, Lima e Advogados permanece à disposição para maiores esclarecimentos.