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12/jan/2021
Cordeiro
Sancionada a Nova Lei de Falências e Recuperação Judicial: Alterações Trazidas pela Lei nº 14.112/2020

O presidente Jair Bolsonaro sancionou, em dezembro passado (24/12/2020), com 6 (seis) vetos ao projeto inicial aprovado pela Câmara os Deputados, a nova Lei de Falências – Lei n. 14.112/2020 (“Lei”). A Lei modifica diversos pontos da Lei n. 11.101, de 2005, que regulamenta a recuperação judicial, extrajudicial e falência empresarial, bem como alterou os dispositivos da Lei 10.522, de 2002, que disserta acerca do cadastro informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais.  

A intenção do governo federal é de melhorar a capacidade de recuperação de crédito das empresas em recuperação judicial com maior celeridade, especificamente em 4 (quatro) anos. Segundo o secretário da Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, esta é “uma meta factível, tem alta probabilidade de ser realizada”, sendo a “mais importante reforma microeconômica dos últimos anos”.

A Lei foi originada do Projeto de Lei n. 6.229/05 na Câmara dos Deputados, aprovado pelo Senado Federal em novembro de 2020 e entrará em vigor em 24 de janeiro de 2021. Ao todo, foram 6 (seis) vetos exercidos pelo presidente, que ainda passarão pela análise do Congresso Nacional, que poderá ou não os derrubar. 

Cabe destacar as seguintes disposições sujeitas ao veto presidencial: (i) a suspensão de execuções trabalhistas durante a recuperação judicial; (ii) os benefícios tributários na renegociação de dívidas de pessoa jurídica em recuperação judicial; (iii) a isenção de impostos sobre o lucro da venda de bens; (iv) a inclusão das hipóteses de caso fortuito e força maior como causas excludentes na cobrança da Cédula de Produto Rural (CPR); e (v) a previsão de recuperação judicial para cooperativas médicas; e (vi) a permissão de venda de bens livre de ônus em planos de recuperação judiciais aprovados.

Apesar dos 6 (seis) vetos, a Lei foi fiel ao texto inicial, atualizando cerca de 40 (quarenta) artigos e incluindo novos 60 (sessenta), havendo atualizações no âmbito societário, tributário e trabalhista, abrangendo questões anteriormente silenciadas pela legislação, como a recuperação judicial de produtores rurais, existência de grupos societários e cooperação com autoridades estrangeiras, entre outras.

Dentre as principais alterações trazidas pela Lei, vale ressaltar as seguintes novidades:

  • Suspensão das Execuções

A partir do deferimento do pedido de recuperação judicial, o chamado Stay Period se inicia, de modo que fica suspensa, por 180 (cento e oitenta) dias, as execuções e atos de constrição contra o devedor (“Stay Period”), visando proteger o devedor para possíveis negociação com credores no plano de recuperação judicial.

A nova Lei permite a prorrogação do prazo de 180 (cento e oitenta) dias apenas por igual prazo uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal. Excepcionalmente, caso credores apresentem plano alternativo de recuperação judicial nas hipóteses previstas no art. 6º, § 4º e 4ª-A e art. 56, §4º, o período poderá ser prorrogado pela segunda vez (art. 6, §4º e 4-A).

Além disso, ficam suspensas ainda qualquer forma de retenção, arresto, penhora ou constrição judicial ou extrajudicial contra o devedor, incluída a de credores particulares de sócio solidário (art. 6º, III).

Nos casos de urgência, o Stay Period não começará do deferimento da recuperação, mas será concedida tutela antecipada para que seja iniciado desde o protocolo.

Outra inovação apresentada é a possibilidade de aplicação do Stay Period em Recuperações Extrajudiciais, que ocorrerá exclusivamente em relação às espécies de crédito por ele abrangidas (art. 6, III).

  • Rol de Credores

De acordo com a nova legislação, a classe com privilégio será eliminada, mas a ordem de classificação permanecerá, conforme o disposto no seu art. 83, sendo que terá sua vigência apenas para as novas falências.

  • Apresentação de Plano Alternativo por Credores

Poderá ser apresentada proposta ao plano apresentado: (a) na hipótese de, decorrido o prazo do Stay Period, não ter havido deliberação acerca do plano, ou (b) para substituir plano rejeitado em Assembleia Geral de Credores (AGC), desde que não seja possível o cram down (ou seja, quando o plano de recuperação judicial é aprovado mediante a deliberação da maioria dos credores, os que não o aprovaram devem, necessariamente, conformar-se com este). O plano alternativo deverá: (i) conter discriminação dos meios de recuperação a serem empregados, (ii) ter anuência por escrito de credores que representem, alternativamente, mais de 25% (vinte e cinco por cento) dos créditos totais sujeitos à recuperação judicial ou mais de 35% (trinta e cinco por cento) dos créditos dos credores presente à assembleia; (iii) liberar as garantias prestadas por coobrigados; (iv) não impor ao devedor ou aos seus sócios sacrifício maior do que aquele que decorreria da liquidação na falência; e (v) não imputar obrigações novas, não previstas em lei ou em contratos anteriormente celebrados, aos sócios do devedor. Cabe frisar que somente será permitido após a vigência da nova Lei.

  • Produtor Rural

Os produtores rurais que atuem como pessoas físicas poderão pedir recuperação judicial, não podendo envolver crédito superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) (art. 70-A). No entanto, somente estarão sujeitos à recuperação judicial os créditos que decorram exclusivamente da atividade rural, ainda que não vencidos (art. 49, § 6º).

A regularidade da atividade rural poderá ser comprovada por meio da ECF ou registros contábeis que a substituam. No caso de pessoa física, a comprovação pode se dar com base no Livro Caixa Digital do Produtor Rural (LCDPR) ou registros contábeis que venha a substituir o LCDPR, e pela Declaração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF) e balanço patrimonial.

  • Possibilidade do Fisco de Requerer a Falência de Devedora

O Fisco poderá requerer a recuperação judicial do devedor em falência caso (i) haja descumprimento dos parcelamentos dos débitos previstos no art. 68 da LRF ou da transação prevista no artigo 10-C da Lei nº 10.522/2020; ou (ii) for identificado esvaziamento patrimonial do devedor que implique liquidação substancial da empresa, em prejuízo de credores não sujeitos à recuperação judicial.

  • Parcelamento de Dívidas

A nova Lei autorizou o parcelamento, por empresas em recuperação judicial, de dívidas em até 120 (cento e vinte) prestações mensais ou, caso seja da preferência da empresa, apresentar proposta de acordo à Procuradora-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), respeitado o prazo máximo de 120 (cento e vinte meses), bem como o limite máximo de desconto de até 70% (setenta por cento) (art. 10-C).

  • Mediação e Conciliação

A nova legislação traz incentivos ao uso de métodos consensuais de solução de conflitos, como a mediação e conciliação, especificando as matérias que poderão ser objeto de negociação entre as partes e quais não poderão, como nos casos sobre natureza jurídica e classificação de créditos concursais, bem como critérios de votação em AGC.

São, inclusive, admitidas de forma antecedente à recuperação judicial, podendo requerer tutela de urgência cautelar, a fim de suspender as execuções contra as empresas propostas pelo prazo de até 60 (sessenta) dias para tentativa de composição com seus credores. Caso seja requerida a recuperação judicial pela devedora, o prazo será descontado.

No entanto, o acordo obtido por meio de conciliação ou de mediação deverá ser homologado pelo juízo competente (art. 20-C).

  • Voto Abusivo

A nova Lei passa a dispor acerca do voto abusivo, sendo que o voto do credor poderá ser declarado nulo por abusividade somente quando manifestamente exercido para obter vantagem ilícita para si ou para outrem.

  • Distribuição de Lucros

É expressamente vedado ao devedor, até a aprovação do plano de recuperação judicial, realizar distribuição de lucros ou dividendos a sócios e acionistas, em observância às normas que regulam a fraude contra credores.

  • Fresh Start

A nova legislação traz o conceito de “Fresh Start”: objetiva que as empresas falidas fechem seus negócios ou os repassem a terceiros para que se livrem rapidamente das dívidas, ou seja, é a reabilitação do falido para nova atividade empresarial. O Fresh Start estará positivado como princípio a ser buscado na falência (art. 75).

  • Extensão da Falência

É vedada a extensão da falência ou de seus efeitos, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falida.

Por fim, a equipe do Cordeiro, Lima e Advogados está à disposição para responder quaisquer questionamentos sobre o tema.